29/02/2024

CONSELHEIRO VIVE - 194 DE NASCIMENTO DE ANTONIO CONSELHEIRO

 

CONSELHEIRO VIVE

Mestre Pádua de Queiróz

 

Esferogravura de Pádua Queiróz
Mestre da Cultura Tradicional Popular do Estado do Ceará
Tesouro Vivo - SECULT/CE

Na antiga Nova Vila

De Campo maior, enfim

No mesmo lugar que hoje

É meu Quixeramobim

Sob o sol quente e mormaço

No dia 13 de Março

No sertão que não tem fim.

 

Nasceu este cearense

Decantado em cordel

Retratado no cinema

Ilustrado num painel

Seu nome virou canção

Liderou revolução

A Deus foi sempre fiel.

 

Antônio Vicente Mendes

Maciel, foi batizado

Era mil e oitocentos

E trinta, bem no reinado

Do primeiro imperador

Do perpétuo protetor

Do recém império criado.

 

Logo no ano seguinte

Dom Pedro abdicou

Deixando o seu reinado

Para um filho, que gerou

Um brado ecoou no mundo

Viva Dom Pedro Segundo

Que um Império herdou.

 

Como possuía apenas

Cinco anos de idade

O imperador menino

Não tinha autoridade

Conforme a constituição

Regentes foi a opção

Até a maioridade.

 

Porém foi nesse período

Chamado regencial

Que criaram no Brasil

Uma Guarda Nacional

Com intuito de proteger

E com a força defender

Os poderosos em geral.

 

Tinha dez anos de idade

O nosso Antônio Vicente

Quando Dom Pedro Segundo

Da Nação tomou a frente

No Sul a era Mauá

Mas aqui no Ceará

Era a seca inclemente.

 

O sertanejo esperava

A Providência divina

O rico tinha fortuna

O pobre tinha a ruina

A lei enxergava um lado

Pois para o pobre coitado

Era o não e a lazarina.

 

Seu pai um comerciante

Para não vê-lo em apuro

Já havia planejado

Qual seria o seu futuro

Naquele sertão severo

Fazendo parte do clero

Estaria enfim Seguro.

 

A sua mãe também tinha

Esse mesmo pensamento

Seu filho seria padre

Para viver sem tormento

Mas que destino azedo

Sua mãe partiu tão cedo

Só restando o lamento.

 

E sem o calor materno

Antônio assim cresceu

A ler e escrever bem

Ele logo aprendeu

Porém naquele cenário

O sonho do seminário

Até o pai esqueceu.


Era um leitor assíduo

De tudo o jovem lia

Do místico ao religioso

Da lei vigente que havia

Era um sujeito informado

Porém não era formado

Mas de tudo ele sabia.

 

Quando Antônio Vicente

Fez vinte e cinco de idade

Era um sujeito querido

Naquela comunidade

Porém de novo o destino

Que para o seu desatino

Levou para eternidade.

 

O seu pai, e agora órfão

Decidiu então casar

Com sua prima Brasilina

Noutro canto foi morar

E chegando em Sobral

Numa atitude legal

Começou a lecionar.

 

Em seguida como rábula

Advogou com sucesso

Pois conhecia os atalhos

De uma causa, um processo

Enfrentando a vida braba

Morou em Guaraciaba

Sempre buscando progresso.

 

Depois em Santa Quitéria,

Que era ainda um povoado

De lá partiu para Ipu

Onde tudo deu errado

Flagrou em plena traição

Seu amor, sua paixão

Nos braços de um soldado.

 

Pra superar a traição

Partiu para o Cariri

Naquela época romeiros

Viviam zanzando ali

Flagelados e penitentes

Povos de fé e carentes

Que tentavam resistir.


As intempéries climáticas

O descaso, o abandono

Porém sem perder a fé

Em Deus Pai e Soberano

Viver “qui nem peregrino”

Pelo sertão nordestino

Decidiu, ser o seu plano.

 

Dali rumou pra Sergipe

Juntamente com seus pares

Notícias suas se ouvia

Em diversos lugares

Para ouvir a pregação

Conselhos e pegar na mão

De Santo Antônio dos Mares.

 

Então chegou na Bahia

Já com a fama de santo

Era Antônio Conselheiro

Trajando um surrado manto

Ali foi caluniado

Foi preso e deportado

De volta para o seu canto.

 

Pois prenderam injustamente

Nosso querido beato

Espalharam sem Piedade

Contra ele um boato:

“Ele se esconde por cá

Porque lá no Ceará

Cometeu assassinato!”

 

Disseram que ele havia

Matado mãe e ex-mulher

E vivia em liberdade

Sem um julgamento sequer.

Foi por um júri inquerido

E depois absolvido

Não houve crime qualquer.

 

Quando sua mãe morreu

Ele ainda era uma criança

Sua mulher lhe traiu

Ele perdeu a esperança

Então virou peregrino

E pelo sertão nordestino

Começou sua andança.


Virou Antônio dos Mares,

Bom Jesus e Conselheiro

Pelo sertão trabalhou

Foi professor, foi caixeiro,

Antes de virar beato

Não houve sequer um fato

Que o tornasse desordeiro.

 

Como era um homem livre

Retornou para Bahia

Quanto mais ele pregava

Mais o povo lhe seguia

Fez açude, ponte, igreja

E assim naquela peleja

Vivia em harmonia.

 

Foi proclamada a República

Exilaram o Imperador

Deram um golpe de Estado

O bem não tinha valor

Mais cada dia aumentava

O grupo que acreditava

No conselheiro e senhor.

 

Que não era simpatizante

Da forma que o país

Era então governado

Maltratando os civis

E decide se estabelecer

Para se proteger

De tantas forças hostis.

 

Chegando então em Canudos

Se agrada com o local

As margens do “Vaza Barris!

Funda então um arraial

Onde acolhe os excluídos

Ex-escravos e perseguidos

Sendo o líder espiritual.

 

O arraial foi crescendo

E também incomodando

Era autossustentável

Todo mundo trabalhando

Quem chegava em Belo Monte

Via um novo horizonte

Nova vida começando.


No jardim quando floresce

A flor do bem que se faz

É preciso ter cuidado

Porque o mal é capaz

Justificando a ação

O motivo e a razão

Da Guerra é obter a paz.

 

A paz ali existia

Prosperidade também

Porque o bom Conselheiro

Pregava sempre o bem

Porém quatro expedições

Embrenhou-se nos sertões

No fim não sobrou ninguém.

 

Foi em mil e oitocentos

E noventa e seis travada

Precisamente em Uauá

Durante a madrugada

Abençoada e benta

Numa batalha sangrenta

A fé venceu a espada.

 

O Tenente Pires Ferreira

Dessa tropa era membro

Que bateu em retirada

Em vinte e quatro de novembro

A Segunda expedição

Era mais que um pelotão

Foi no final de dezembro.

 

Que também foi debelada

Pelos conselheiristas

Que em questão de Caatinga

Eram especialistas

O major Febrônio de Brito

Pinotou feito um cabrito

E fugiu sem deixar pistas.

 

Quem ficou indignado

Foi prudente de Morais

Que convocou com urgência

Seus melhores generais

Logo veio a indicação

Para pôr fim na questão

Quem tinha as credenciais.


Antônio Moreira César

O terrivel coronel

Conhecido “Corta-Cabeças”

Entre os pares do quartel

Comandou esta empreitada

E teve a vida ceifada

Por um atirador fiel.

 

A Antônio Conselheiro

Pois já não mais duvidava

Da santidade daquele

Que até uma bala guiava

E o governo federal

Reunido na capital

Findar Canudos tramava.

 

A derrota de Moreira

César, compreendia

Canudos ou era um Estado

No Estado ou pretendia

Através de Conselheiro

Em território brasileiro

Restaurar a monarquia.

 

O arraial de Belo Monte

Tinha de vez que acabar

E a quarta expedição

Quem iria comandar

Com toda a sua logística

E não temia a mística

O general Artur Oscar.

 

Que a primeira batalha

Travou em Cocorobó

Em junho de mil e oitocentos

E noventa e sete, o pó

Da terra se misturou

Com o sangue que jorrou

Do sertanejo sem dó.

 

E foram inúmeras batalhas

Que pintou o sertão de rubro

Passou julho e agosto

Setembro, chegou outubro

Por fim, a Guerra acabou

Quando Canudos tombou

Mas confesso não encubro.



A Guerra, a incompreensão

A atitude cruel

Do governo federal

Que recordo em cordel

Deixou o país manchado

Ao tomar Partido e lado

Ao povo foi infiel.

 

Hoje conselheiro vive

Voltou pra Quixeramobim

Conselheiro é Dona Chica

Conselheiro é Seu Mundim

Conseheiro é essa gente

Que sonhando e segue em frente

Neste meu sertão sem fim.