04/01/2011

LAMPIÃO E MARIA BONITA - PÁDUA DE QUEIROZ

LAMPIÃO E MARIA BONITA E AS MULHERES DO CANGAÇO
Com aféto e gratidão para MARIA QUEIRÓZ
Pádua de Queiróz
Tenho São Miguel Arcanjo
Dentro do meu coração
Tenho força e alegria
Tenho a Santa Proteção
Tenho uma fé inesgotável
Minha mão magra e incansável
Sempre escreve Lampião.

Em mil novecentos e trinta
Em meados de Fevereiro
Lampião necessitando
Os serviços de sapateiro
Para concertar as cangas
E encomendar bugingangas
Apetrechos cangaceiros:

Apragatas, barbicachos,
Cinturões de cartucheiras,
Bruacas, chapéus e tiras,
Embornais e bandoleiras...
E mandou que Luis Pedro
Fosse de manhã bem cedo
Com mais dois da cabroeira.

Como estavam acampados
No raso da Catarina
Vendo os quimbembes velhos
Totalmente em ruinas
Aproveitaria o descanso
No cenário seco e manso
Naquela dura rotina.

E Luis Pedro Partiu
Naquele seco caminho
Ladeado por Cambaio
E por Vicente Marinho
Encomendar o serviço
E depois pagar por isso
Se fosse rápido e certinho.

O sapateiro escolhido
Diziam: tudo remenda!
Chamava-se, Zé de Neném
Seria dele a encomenda.
E Zé tinha em sua casa
Um lindo Anjo sem asa
Uma verdadeira prenda.

Seu nome, Maria Alina
Apelido, Maria de Déia
Que casada há oito anos
Sonhava com uma epopéia,
Coisa talvez ipossível
Pois seu marido insenssível
Desprezava essa idéia.

Só pensava em bater sola
Porque era seu ofício
E viver naquele Sertão
Já era um sacrifício
Sua mulher simplesmente
Já pensava diferente:
Aquilo era um desperdicio!

Homem era Lampião
Que combatia e dançava,
Em Carira e Sobradinho
E em Aquidabã mandava,
Bandido de coração nobre
Fiél protetor dos pobres
Que todo Sertão respeitava!
Luis Pedro, ouviu tudo
E contou pra Lampião
Que assim disse: meu compadre,
Com essa eu não bulo não
E toda mulher casada
Deve é ser respeitada
Não mudo de opinião!

E Luis disse: Vá lá,
Somente pro Senhor ver
Essa mulher que eu falo
Juro não vai esquecer,
Aquele rosto tão belo
Parece um Anjo singelo
Que no Sertão foi viver!

E continuou Luis Pedro:
O marido nem dá bola!
Ela até me confessou
Que a noite ele não consola,
Sua solidão de mulher
Porém se o Senhor quiser
Na estrada mete sua sola.

Lampião falou: seu cabra
Vamos deixar de conversa,
Não se fala mais no assunto
Eu não entro numa dessa
Tá na hora de dormir
Amanhã vamos sair
Mas pra ir buscar as peças.

No Raso da Catarina
O Sol nasceu diferente,
E depois de muito tempo
O Nordeste, sorridente.
Tudo então parecia
Que a Paz e a Harmonia
Triunfava novamente.

Com um uniforme impecável
Lenço em volta ao pescoço,
Perfumado e barbeado
Parecia até mais moço
Lampião apareceu
E com o jeito só seu
Ordenou sem alvoroço:

Compadre Luis vá chamar
Bem ligeiro, Beija-Flor!
Pensativo Luis disse:
Isso é mesmo o amor.
O nosso Rei a tardinha
Vai conhecer sua Rainha
E ele é merecedor!

E ao chegar na porteira
Da casa do sapateiro
Nem deu tempo desmontar
O chefe dos cangaceiros,
Quando apareceu cheirosa
A mais bela e mais formosa
Do Nordeste brasileiro.

Lampião adimirado
Nem queria acreditar,
Seria mesmo verdade
Ou estava a sonhar.
E sorrindo de contente
Viu ali na sua frente
O verdadeiro amor brotar.

Que, que Ma, Maria Bonita!
Ele falou gaguejando.
E lhe estendendo a mão
Num gesto comprimentando.
Era só felicidade
Que sem ter dificuldade
Rápido foi desmontando.

E pra sentar-se a sombra
Ela então o convidou,
E para ouvir a conversa
Até o tempo parou.
Maria falava tudo
E Lampião semi- mudo
Criou coragem e falou:

É verdade que você
Tem coragem de ír comigo?
Ela respondeu: vou sim,
E não temo o perigo.
E se o Senhor quiser
Eu serei sua mulher
E vou embora contigo!

Lampião disse: mulher
Casada que já tem dono...
Ela interrompeu dizendo:
Eu vivo no abandono.
Quero viver a seu lado
Como dois apaixonados,
Esse sim é o meu plano!

Dona Déia que estava
Espiando na janela,
Inspirou aliviada
Vendo sua filha tão bela
Ao lado de Lampião
Governador do Sertão
Totalmente escravo dela.

E convidou o casal
Pra ír comer na cozinha.
Enquanto Zé de Neném
O seu trabalho mantinha.
Com certeza receioso
Nem sentia o cheiro gostoso
Do queijo, café, farinha,...

Mesmo espiando tudinho
Que estava acontecendo
Zé de Neném só olhava
E a sola ía batendo.
Lampião despreoculpado
Por Maria apaixonado
Viu o Sol se escondendo.

Voltou para o acampamento
Mas antes disse a Maria:
Amanhã bem cedo eu volto
Antes do nascer do dia.
Você vai morar comigo
Vou enfrentar o perigo
Mas na sua companhia!

Nem bem o dia raiou
Lampião já estava lá,
Na porta do sapateiro
E antes de dizer, olá.
Maria veio correndo
E pra ele foi dizendo:
Eu não fico mais por cá!

Zé de Nenem que tomava
Seu mingal de Carimã,
Parecia um agricultor
Ouvindo o som da Acauã.
Enquanto lá fora a harmonia
Dos primeiros raios do dia
Embelezava a manhã.

Zé olhou para a janela
E falou com a vóz serena,
Até mesmo a escolta
De Lampião sentiu uma pena.
Maria, tu vai me deixar?
E Lampião, sem se importar
Partiu com sua pequena.

Porém deixou uma carta
Escrita com a própria mão,
Pra que todo mundo soubesse
Que ele não era ladrão,
Relatando que Maria
Foi pra sua companhia
Por sua própria opção.

Com uma grande festança
Lampião comemorou,
Xaxado, xote e polca
Naquela noite dançou,
Com sua Maria Bonita
Toda enfeitada de fita
Virgulino se Casou.

Já era nove da noite
A peitica e o bacural
Entretidos espiavam
De cima de um pé de pau.
Quando Lampião e Maria
De fininho escapulia
Para noite nupcial.

Com a entrada de Maria
Na rotina do cangaço
Quem possuisse mulher
Oficializasse os laços
Lampião deu o direito
A todos no mesmo leito
Ocupar o mesmo espaço.

Algumas eu tenho em mente
Eis aqui a relação:
Sila com Zé Sereno,
Maninha com Gavião,
Rosinha com Mariano,
Lídia com Zé Baiano,
E Leolina com Azulão.

Maroca com Mané Moreno,
Aldina com Paturí,
Catarina com Sabonete,
Dussanto com Alecrim,
E o tempo ía passando
E a tropa aumentando
Maria com Jurití.

Lilí com Moita Brava,
Veronquinha com Beija-Flor,
Entre tantas que aprenderam
A enfrentar o terror,
Mocinha mulher de Medalha
Não fugia da batalha
Defendendo o seu amor.

Foram mulheres que o amor
Moldou para aquele cenário
Neném foi de Luis Pedro,
Adília foi de Canário,
Dora foi de Arvoredo
E desconhecia o medo
Do cangaço ex-solitário.

Enfrentavam uma luta,
Não temiam uma abordagem...
Por isso a essa mulheres
Eu presto a minha homenagem.
Apesar da triste sorte
Muitas encontraram a morte
Mas morreram com coragem.

AUTOR: PÁDUA DE QUEIROZ
paduadebaturite@hotmail.com

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